Não vou fazer um post longo a respeito do Copland, meu compositor estadunidense predileto, porque estou me programando pra ir pra Brasília, ver como estão as coisas na filial do Café do Rato Preto. Costumo dizer a meus amigos que Copland é o Villa-Lobos dos States, referindo-me à representatividade nacional de ambos em nível mundial, mas no contexto da história da música estadunidense Copland está mais para um Guerra-Peixe, enquanto o Villa de lá seria Charles Ives.
Ives foi autodidata, conhecia a música de diversos rincões do país em que viveu, internalizou-a de forma difusa e a amalgamou com os estilos em voga na Europa – pra não citar outros pontos semelhantes com o Villa. Copland tinha uma linguagem mais árida no início, atonal, mas se voltou às raízes da música popular e folclórica dos States e do Caribe e clareou as cores instrumentais que usava, do mesmo jeito que Guerra-Peixe abandonou o dodecafonismo e abraçou o nacionalismo no final dos anos 40.
Copland estudou com a magnética e sapiente madame Nadia Boulanger de 1918 a 1921 e virou amigo dela pro resto da vida. Os registros que ele deixou da amizade epistolar entre ambos estão guardados na Biblioteca do Congresso Americano e disponíveis na Internet. Tive a oportunidade de vê-la passando pela rua diversas vezes indo pro famoso La Coupole, antes de eu comprar o Little Black Mouse Café, em 1945. Então ela virou minha habitué, pois eu providenciava café brasileiro autêntico e uma iguaria bem doce, mas dura que só vendo, chamada rapadura.
Boulanger, ao experimentar pela primeira vez a rapadura iguatuense que ofereci, encantou-se não só pelo sabor mas “pela personalidade do alimento”, segundo ela: “É igual à minha: doce, mas de uma doçura que demora a se extinguir, diferente de um chocolate, porque antes de tudo é firme”. Nadia tava quase com 58 anos quando virou minha cliente, mas eu, como muitos dos alunos dela, era apaixonado por aquela figura magra, intelectual e vibrante. A misoginia de Nadia (cogita-se que ela tenha morrido celibatária) foi empecilho para a aproximação afetiva que tantos sonharam.
Vamos aos CDs. Segue pra vocês um álbum duplo com tudo o de melhor da música sinfônica de Copland. Essa é a mais essencial coletânea que vocês podem encontrar dele. Três orquestras, três maestros, nenhuma ressalva. Tenho interpretações mais brilhantes da Primavera apalache, da Fanfarra para o homem comum e de O Salão México, mas estas são igualmente muito boas.
Constam ainda os balés Billy the Kid e Rodeo, os Três quadros sinfônicos (única obra pouco inspirada nessa lista), a suíte da trilha sonora de The red pony (filme adaptado do romance de Steinbeck) e o contagiante Danzón cubano, de muito mais appeal que O Salão México e pelo qual vocês devem começar a ouvir os CDS. Por sinal, lá pelos anos 50 adquiri o Salão México – onde Carlos Chávez insistentemente me oferecia tequila, ainda que eu dissesse que nem de cachaça gosto – e o transformei em mais uma franquia do Café do Rato Preto.
Não há o que explicar sobre as obras. Escutem-nas sem medo de gostar demais delas. Depois vocês procuram saber dos detalhes.
CD 1
1. Danzón Cubano – Eduardo Mata/Dallas Symphony Orchestra
2. Copland: Billy The Kid: The Open Prairie – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
3. Copland: Billy The Kid: Street In A Frontier Town – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
4. Copland: Billy The Kid: Mexican Dance And Finale – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
5. Copland: Billy The Kid: Prairie Night (Card Game At Night) – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
6. Copland: Billy The Kid: Gun Battle – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
7. Copland: Billy The Kid: Celebration (After Billy’s Capture) – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
8. Copland: Billy The Kid: Billy In Prison (His Escape) – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
9. Copland: Billy The Kid: Billy In The Desert – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
10. Copland: Billy The Kid: Billy’s Death – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
11. Copland: Billy The Kid: The Open Prairie Again – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
12. Copland: Appalachian Spring: Very Slowly – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
13. Copland: Appalachian Spring: Allegro – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
14. Copland: Appalachian Spring: Moderato – The Bride And Her Intended – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
15. Copland: Appalachian Spring: Fast – The Revivalist And His Flock – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
16. Copland: Appalachian Spring: Allegro – Solo Dance Of The Bride – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
17. Copland: Appalachian Spring: Meno Mosso – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
18. Copland: Appalachian Spring: Doppio Movimento – Variations On A Shaker Hymn – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
19. Copland: Appalachian Spring: Moderato – Coda – Leonard Slatkin/Saint Louis Symphony Orchestra
CD 2
1. Copland: Fanfare For The Common Man – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
2. Copland: Rodeo: Buckaroo Holid – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
3. Copland: Rodeo: Corral Nocturne – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
4. Copland: Rodeo: Piano Interlude And Saturday Night Waltz – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
5. Copland: Rodeo: Hoe-Down – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
6. Copland: El Salon Mexico – Eduardo Mata/Dallas Symphony Orchestra
7. Copland: The Red Pony Suite: I. Morning On The Ranch – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
8. Copland: The Red Pony Suite: II. The Gift – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
9. Copland: The Red Pony Suite: III. A) Dream March – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
10. Copland: The Red Pony Suite: III. B) Circus March – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
11. Copland: The Red Pony Suite: IV. Walk To The Bunkhouse – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
12. Copland: The Red Pony Suite: V. Grandfather’s Story – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
13. Copland: The Red Pony Suite: VI. Happy Ending – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
14. Copland: Dance Symphony: I. Introduction – Lento – Molto Allegro – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
15. Copland: Dance Symphony: II. Andante Moderato – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
16. Copland: Dance Symphony: III. Allegro Vivo – Enrique Batiz/Orquestra Filarmonica De La Ciudad de México
Eduardo Mata / Dallas Symphony Orchestra
Leonard Slatkin / Saint Louis Symphony Orchestra
Orquesta Filarmónica de la Ciudad de México / Enrique Bátiz
CVL
Meu primeiro contato com Copland, assim como o de muita gente de minha geração, foi através da banda de rock progressivo “Emerson,Lake & Palmer”, genial trio inglês que abria (e acho que ainda abre) seus shows com “Fanfare for a Common Man”, ou “Rodeo”. Aliás, era comum esta banda tocar outros clássicos contemporâneos, como Prokofiev e Stranvisky. O próprio Keith Emerson, tecladista da banda, e pianista com formação clássica, tinha um Concerto para Piano de sua autoria, e que tocava nos shows da banda.
Enfim, virei fã de Copland desde então.
Bela postagem, Ciço.
Ciço.
Realmente, embora Copland não gostasse muito das releituras de ELP, eles foram responsáveis por muito da popularidade do compositor entre gerações mais jovens e corroboram o quanto de apelo direto a obra dele tem, sem falar dos dividendos em direitos autorais (risos).
Quanto aos músicos de formação erudita que deram uma guinada no rock nos anos 60 e continuaram mandando ver nos 70, tem uma penca que me veio à mente agora. Daqui pro final do ano vou mandar um post “daqueles”.
Valeu, FDP.
A banda também adaptou uma peça de Ginastera no disco “Brain Salad Surgery”, (tocatta) que eu sempre quis ouvir no original… seria possível, Ciço? O próprio Carl Palmer tem um disco solo, pós ELP, em que ele adapta Canarios, de Rodrigo… Agora, outro que eu ia adorar ouvir mais, se possível, lógico, era uma das maiores influências de Frank Zappa, citada por ele mesmo: Edgard Varese.
Mas já está bom demais…
Abraço e obrigado!
Bom conversar com quem conhece.
A obra completa de Varèse (que cabe em um CD duplo) já foi postada há algum tempo pelo mano CDF. Basta procurar no menu aí do lado pelo sobrenome do compositor.
Quanto a Zappa, só posso dizer que você, Gilberto, leu meu pensamento.
Putz, perdão!
Baixei esse disco do Varese nos primeiros dias em que ele foi postado, e é um dos meus preferidos do Blog. Tinha esquecido completamente (ou não quis acreditar) que ele compôs tão pouca coisa…
Com relação ao post “daqueles”, vou aguardar ansiosamente. é bem na minha área. se precisar de algo, tenho muita coisa aqui que pode interessar, e posso ajudar com os Zappas, se bem entendi a mesagem…
Abraço!
Copland é bem legal mesmo. Além das obras disponibilizadas acima, gosto muito da “Sinfonia Orgão”, que é supreendente, e do “Concerto para clarinete”, muito lírico, muito bonito. Tem outra obra que eu acho curiosíssima e pra lá de divertida, “Retrato de Lincoln”, para narrador e orquestra. Eu acabei decorando o texto, até, e não consigo me furtar a imitar o narrador da gravação que tenho, James Earl Jones. “Fellow-citizens, we cannot escape history”…
(Para quem não se lembra, James Earl Jones fez no cinema a voz de Darth Vader…)
Gilberto, tens o ‘Yellow Shark”, do Zappa?
Não sei onde foi parar o meu cd… possivelmente emprestei para algum “amigo” que nunca me devolveu…
Engraçado você falar isso…
Eu sou fão do Zappa, e tenho vários discos dele. Mas o meu yellow shark eu também perdi. O meu caso foi mais trágico.. uma mudança. Encarreguei um amigo de levar os cds pra mim… e ele deixou a caixa cair. Perdi ele, o Hot Rats e o The best band that you ever heard… e não deu nem pra xingar o danado.
Consegui recuperar todos, menos o Yellow. Um tempo atrás até consegui um arquivo dele, mas falta a introdução e a ultima musica. e está em 128 Kbps, não muito bom… Mas deu pra matar a saudade. se quiser… tá a disposição.
abraço.
Parabéns do seu precioso Blog.
Já o conhecia mas na formação anterior e pensei que estivesse extinto. Uma alegria reeencontra-lo.
Obrigada pela precioso conteúdo.
Abraços,
Luci
ps: vocês tem possibilidade dos discos de Eugene Cicero? Em especial “Classic in Jazz” em 5 ou 6 discos ; é uma obra maravilhosa, mas perdi este arquivo.
Obrigada .
olá….os links estão expirados…Anyway, agradeço pela contribuição pelo aumento do meu repertório de músicas (poderia até arriscar a dizer que agradeço pela ampliação de meus horizontes musicais e minha sensibilidade).
Abraços (ótimo blog)!!!
Copland daria um tremendo jazz man.
Villa-Lobos americano? Isso é ofensivo; Copland é bom demais para ser comparado àquele arqui-chato cuja obra importante se resume àquela melodia bonita.
Mas eu sou meio stravinskyano, então, meio esperado eu odiar Villa-Lobos.
Oi, pessoal.
Antes de tudo, meus parabéns por todo o trabalho que vocês realizam aqui!
Não sei como seria minha inserção à música clássica sem o trabalho do PQP Bach!
Depois, se não for um abuso, será que vocês poderiam re-revalidar os trabalhos sinfônicos de Copland?
Muito obrigado, e mais uma vez, parabéns!