La Colombina O Natal na Espanha e nas Américas Século XVI
Quatro cantores, solistas de renome, cujos caminhos se cruzaram em várias produções, madrigalistas fervorosos e, além disso bons amigos, decidiram formar um conjunto em novembro de 1990: La Colombina, o nome da coleção de música do final do século XV mantido na Biblioteca Colombina em Sevilha.
Cosmopolitas e muito latinos na formação, o conjunto é composto por um argentino, um italiano e dois catalães, especializados em música renascentista e música barroca, tanto religiosa como secular, cantando em sua maioria ‘a cappella’.
Enquanto o repertório favorito do grupo é muitas vezes espanhol, ele não deixa de excursionar pela música da França e especialmente da Itália. Desde a sua fundação, além de uma programação de gravação regular, La Colombina tem dado concertos na França, Bélgica, Espanha, Itália, Suíça, Holanda, Israel …
(traduzido do encarte)
O Natal na Espanha e nas Américas no séc. XVI Anonymous. Convento del Carmen, Mexico 01. Domine labia mea aperies – Deus in adjutorium Juan Gutiérrez de Padilla (Málaga, Espanha c.1590 – Puebla, México, 1664) 02. Christus natus est nobis Estêvão de Brito (Portugal, 1570-Spain, 1641)/Tomás Luis de Victoria (Spain, 1548-1611) 03. Jesu Redemptor omnium – Tu lumen et splendor Patris – Gloria tibi, Domine Gaspar Fernández (Portugal, 1570?- Puebla, Mexico, 1629) 04. Ensalada de Navidad – Desnudito parece mi Nino 05. Ensalada de Navidad – Ven y veras zagalejo 06. Ensalada de Navidad – Romance: Llegan los quatro al portal 07. Ensalada de Navidad – Romance: Sea para bien el Hijo Divino 08. Ensalada de Navidad – Este Nino se lleva la flor 09. Ensalada de Navidad – Naci tamborilero y sustentar me quiero 10. Ensalada de Navidad – Oy la musica del cielo 11. Ensalada de Navidad – Un relox a visto Andres 12. Ensalada de Navidad – Dominus dixit ad me Cristóbal de Morales (Spain, 1500-1553) 13. Pastores Dicite Quidnam Vidistes Tomás Luis de Victoria (Spain, 1548-1611) 14. O Magnum Mysterium Pedro de Cristo (Portugal, 1545/1550-1618) 15. Beata viscera Mariae – Beate viscera Mariae Virginis Francisco Guerrero (Sevilha, 1528-1599) 16. Oy, Joseph, se os da en el suelo Cristóbal de Morales (Spain, 1500-1553) 17. Ad tantae Nativitatis Estêvão de Brito (Portugal, 1570-Spain, 1641) 18. Crudelis Herodes – Ibant Magi quam viderant – Gloria tibi, Domine Tomás Luis de Victoria (Spain, 1548-1611) 19. Magi viderunt stellam Francisco Guerrero (Sevilha, 1528-1599) 20. Los Reyes siguen la’strella Bartomeu Càrceres (Spain, c.1546) 21. La Trulla
In Natali Domini – Christmas in Spain and the Americas in the 16th Century – 2000
La Colombina
Maria Cristina Kiehr – soprano
Claudi Cavina – alto
Josep Benet – tenor
Josep Cabré – baritono
Lisboa abrigava no século 17 uma cultura musical exuberante e um grande número de igrejas, conventos e mosteiros que mantinham uma refinada tradição de música polifônica.
Entre os mais proeminentes compositores atuantes em Lisboa nos anos iniciais do século 17, cuja música só recentemente começou a receber o reconhecimento que merece, estão Manuel Cardoso, Duarte Lobo, Filipe de Magalhães e Manuel Rodrigues Coelho, que tiveram todos boa parte de suas músicas impressas por editoras de Lisboa e de Antuérpia (hoje na Bélgica).
Esses músicos tiveram diferentes posições de proeminência nas seguintes instituições: Catedral, Igreja da Casa de Misericórdia, Hospital del Rey, Convento do Carmo e Capela Real.
A capela e palácio reais – o Paço da Ribeira, construído por Dom Manuel por volta de 1500 – ficavam à beira-rio. Exceto por algumas alterações significativas feitas em torno de 1610 como parte dos preparos para uma visita de Felipe III da Espanha (a qual na verdade só aconteceu em 1619) a capela permaneceu intacta até o terremoto de 1755, que destruiu grande parte da região central de Lisboa. Registros pictóricos do palácio real no século 17 mostram o edifício completo, com suas alas de estilo clássico acrescentadas por volta de 1586.
De 1580 e 1640 Portugal esteve anexada à Espanha sob os reis Felipe II, III e IV, da Casa de Habsburgo. Durante esse período houve constante trânsito de músicos e de repertórios musicais entre os dois países, especialmente entre Lisboa e Madri. Tanto o português quanto o castelhano eram falados – e cantados – na corte de Lisboa.
Os monarcas espanhóis eram todos amantes e conhecedores de música – e até mesmo compositores -, permanentemente interessados no cultivo da música nas suas cortes e capelas. Quando Felipe II visitou Lisboa pela primeira vez, em 1581-82, mostrou-se claramente desapontado com o padrão musical encontrado ali, queixando-se não apenas de que o coro da capela era fraco, mas também de que não havia organistas competentes, e mandou imediatamente buscar seu organista em Madri, Hernando de Cabezón, filho do grande Antonio de Cabezón.
Esta situação insatisfatória levou o rei a solicitar em 1592 do capelão-mor, o Bispo Jorge de Atayde, que redigisse um estatuto regulando a organização da Capela Real – um documento que fornece importantes informações sobre o tipo e quantidade de músicos e clérigos a serem empregados ali no final do século 16 e seus respectivos salários.
Os músicos incluíam um mestre de capela (diretor do coro polifônico), 24 cantores (o que permitia 6 por voz na música a quatro vozes), dois organistas, dois baixões (fagotes ou outros instrumentos baixos) e um cornetista [tocador de corneto, instrumento de bocal em madeira, diferente de corneta].
A capela era frequentada também por 22 meninos “de boa criação”, quatro dos quais, os “moços de estante”, em treinamento contínuo para sua futura contratação como cantores. A essa lista podem se acrescentar os 30 capelães, procedentes de um número de diferentes ordens religiosas, 26 dos quais eram responsáveis por cantar o cantochão durante os serviços litúrgicos e dos quais se requisitava, portanto, que tivessem boa voz e bom domínio do latim.
Em 1608, seguindo a solicitação de Atayde por reformas, o rei (Felipe III da Espanha) reduziu o número de músicos da capela a 17 cantores (quatro tiples [sopranos], cinco contraltos, cinco tenores e três “contrabaixos”) e a 24 capelães.
No final do século 16 diversos espanhóis haviam ocupado posições importantes na Capela Real portuguesa. Esses incluem Francisco Garro (~1556-1623), que veio em 1524 da cidade de Sigüenza para suceder Antonio Carreña (~1525-~1590) como mestre de capela, e os organistas Juan de Lucerna e Sebastián Martínez Verdugo. Esses dois seriam sucedidos em 1602 por Diego de Alvarado (~1643) – um basco que já havia estado a serviço da coroa espanhola – e em 1604 pelo organista português Manuel Rodrigues Coelho (~1555-1635).
Coelho havia estudado em Elvas (Portugal) e passado algum tempo como organista tanto em Badajoz (Espanha) quanto em Elvas antes de vir para Lisboa em 1602 para assumir um cargo similar. Tanto Alvarado quanto Coelho ainda trabalhavam na Capela Real quando em 1623 Filipe de Magalhães (~1571-1652), que havia ingressado na Capela Real como capelão em torno de 1596, sucedeu a Francisco Garro como mestre de capela – posto em que permaneceu até sua aposentadoria em março de 1641, tendo publicado dois volumes de polifonia vocal em 1636: um livro de versões do Magnificat e outro de Missas.
Como Cardoso e Lobo, Magalhães havia estudado na Catedral de Évora com Manuel Mendes. Enquanto capelão da Capela Real, ensinava cantochão e polifonia aos cantores e dirigia o coro na ausência do mestre de capela Francisco Garro, desempenhando ainda as funções de mestre de capela na Igreja da Casa de Misericórdia. Em 1623, quando finalmente sucedeu a Garro, Magalhães já era um homem maduro, na casa dos cinquenta, e respeitado pelos seus colegas músicos.
Em 1639 a corte real em Lisboa havia se tornado uma instituição exuberante no aspecto musical que, paralelamente aos músicos da capela, tinha um grande conjunto de instrumentistas à disposição. Quando em 1640 Dom João IV ascendeu ao recém-restaurado trono português, essa vida musical se beneficiou das tradições musicais e litúrgicas de que os Duques de Bragança desfrutavam em seu palácio e capela em Vila Viçosa. Lamentavelmente, a famosa biblioteca musical de Dom João IV – que também havia sido transferida de Vila Viçosa para o palácio em Lisboa – foi destruída no terremoto de 1755, porém sobrevive seu índice parcial, impresso em 1649, como um excitante registro da música que era apreciada e provavelmente executada nos círculos reais.
Missa para a Festa da Natividade da Bem-Aventurada Virgem Maria na Capela Real, ~1635
Na Capela Real, os ofícios litúrgicos eram rezados ou cantados diariamente de acordo com o uso romano, e nos dias festivos mais importantes do calendário litúrgico a missa era celebrada com muita pompa e cerimônia, e grande elaboração musical. Nas festas maiores como a Páscoa e Corpus Christi, e nas principais festas marianas, a cidade inteira vibrava com música e dança e procissões coloridas pelas ruas. Uma dessas festas era a da Natividade da Bem-Aventurada Virgem Maria em 8 de setembro, dia no qual se celebrava também uma das festas marianas mais populares em Portugal, a de Nossa Senhora da Luz. Havia diversas igrejas dedicadas a ela país afora, incluindo uma em Lisboa que, a partir do relato da presença de Felipe III sua missa do domingo 8 de setembro de 1619, tornou-se um dos mais populares centros de romarias do século 17.
Há uma vívida descrição contemporânea do estilo da celebração dessa festa em Pedrógão Grande (uma pequena cidade na região de Portugal), a qual retrata um animado festival que incluía procissão bem como dança e música de caráter popular tocada em instrumentos como harpa, rabequinhas, charamelas e trompetes, touradas, entretenimentos teatrais e jejum.
Esta gravação apresenta uma reconstrução parcial da Missa Alta como poderia ter sido celebrada nesse dia de festa na Capela Real, conjugando música vocal e para órgão de compositores dessa capela, tendo como núcleo a Missa Ó Soberana Luz, de FILIPE DE MAGALHÃES, com apoio de outras peças apropriadas a esse tema mariano. O título da missa de Magalhães sugere uma associação com Nossa Senhora da Luz, e a missa pode ter sido baseada num vilancico [ou vilancete, canção popular de tema religioso, em espanhol villancico], talvez de autoria do próprio Magalhães. (Em muitos vilancicos da época, compostos para festas marianas, Maria era designada como rainha – Soberana Reyna ou La Niña Soberana – e se fazia referência a sua luz radiante.
Infelizmente não sobrevive nenhum vilancico desses com origem em Portugal, mas a madrigalística villanesca [um gênero aparentado] La luz de vuestros ojos [faixa 22], de Francisco Guerrero, na qual Maria é tratada inequivocamente como Soberana Maria, fornece uma contraparte em estilo mais popular à missa de Magalhães – levando em conta que a biblioteca de Dom João IV continha uma cópia das Canciones y villanescas espirituales de Guerrero (1589).
Quer baseada no canto gregoriano – como a versão a quatro vozes da antífona Asperges me [faixa 2]-, quer num modelo polifônico, quer composta livremente, a música vocal de Magalhães é em grande medida caracterizada por um stile antico livremente adaptado, abarcando momentos de extrema pungência e de lirismo. Em seu único moteto que sobreviveu, o Comissa mea pavesco [faixa 20], a seis vozes, Magalhães surge como um mestre da expressividade, com o pathos do texto penitencial – muito particularmente nas palavras noli me condemnare [‘não queiras me condenar’] – expresso por dissonâncias intensas.
Das oito versões de Magalhães para a Missa Ordinária publicadas em seu Missarum Liber, a Missa a cinco vozes Ó Soberana Luz se destaca como a de estilo mais incomum. Ela é notável por suas fortes justaposições de passagens em um contraponto impassível com outras escritas com uma veia mais declamatória e ritmicamente animada, com mudanças súbitas de ritmo, caráter e distribuição de vozes – especialmente no Credo e nas palavras Dominus Deus Sabaoth do Sanctus – evocando o estilo de escrita antifonal do período.
Cada uma das seções principais se abre com um motivo capitular proeminente (mesmo se ás vezes sutilmente variado) que consiste de um tema ascendente em uma voz baixa em movimento contrário às duas vozes superiores que se movem em terças. Esses temas, juntamente com aqueles apresentados na primeira seção “Christe”, são entretecidos na textura da missa inteira (por vezes com o tema ascendente usado em imitação entre as vozes), resultando em uma estrutura unificada de artesania extremamente hábil. (Nesta gravação, os Kyries são cantados alternadamente com Kyries em canotchão tradicionalmente cantados nas festas marianas).
O moteto Ave Virgo Sanctissima para cinco vozes [faixa 11], de FRANCISCO GUERRERO (1528-1599) foi uma das peças da polifonia ibérica mais amplamente difundidos na Renascença. Foi publicado pela primeira vez em Paris em 1566 em um volume de missas dedicado a Dom Sebastião de Portugal. Nesse ano Guerrero viajou de Sevilha a Portugal para ofertar pessoalmente o volume ao jovem rei, ocasião em que teria encontrado Antonio Carreira, bem como outros músicos a serviço do rei.
Neste moteto as duas vozes de soprano são combinadas engenhosamente em cânon do começo ao fim, emprestando à peça uma expansividade suave típica de seus motetos escritos em mais de quatro vozes. Um clímax é atingido no meio do caminho na palavra “salve”, como a repetição cromática insistente do início do canto Salve Regina, produzindo uma passagem de extraordinária intensidade.
ESTÊVÃO DE BRITO (~1575-1641), um músico português que passou a maior parte de sua carreira na Espanha (em Badajoz e a partir de 1613 em Málaga, onde foi maestro de capilla na catedral) teria estudado com Magalhães. Seu Salve Regina [faixa 23] a quatro vozes parafraseia e usa imitativamente os contornos melódicos familiares dessa antífona mariana em cada um dos versos polifônicos, atingindo um clímax na súplica final ‘O clemens, O pia, O dulcis Virgo Maria’, onde o canto é ouvido em registro agudo na linha do soprano.
A música para órgão desempenhava muitas funções dentro do desenrolar da liturgia. Podia ser usada para marcar momentos de importância central na missa (como a Elevação), no acompanhamento de outros rituais litúrgicos substituindo itens de cantochão (como o Gradual e o Ofertório, ou versos e respostas executados de modo alternado), ou ainda como música processional.
Toda a música para órgão ouvida neste disco é de compositores que trabalharam da Capela Real de Lisboa durante os séculos 16 e 17, com exceção da peça anônima para a Elevação Obra de sexto tom para o Levantar o Deus [faixa 15] (adaptada de uma peça muito mais longa encontrada em um manuscrito em Braga). Esta obra é singular por ser a única em fontes organísticas portuguesas destinada especificamente à Elevação. É característico do estilo de música a ser tocada nesse ponto da missa que seja ‘grave, devoto e suave’.
Considerando a sólida reputação de ANTONIO CARREIRA entre os teóricos seus contemporâneos, é algo surpreendente que nada de sua música tenha sido publicada durante sua vida, e que as peças preservadas em manuscrito sejam tão pequenas. O Tento executado aqui [faixa 1] é típico da música organística ibérica de meados do século 16, sendo construído tanto com temas como se de motetos tratados imitativamente quanto com texturas animadas que empregam figuras sincopadas.
De DIEGO DE ALVARADO restaram somente duas peças para órgão. Sua um tanto cromática e modalmente aventurosa Obra sobre el Pange lingua [faixa 12] se baseia na frase inicial da versão tradicional desse hino tão popular na Península Ibérica na época (sobretudo na face hispânica).
A música de MANUEL RODRIGUES COELHO foi publicada em Lisboa em 1620 em uma coleção intitulada “Flores de Música” que foi dedicada a Felipe III da Espanha. Na tradição das “Obras de Música” de Antonio de Cabezón (1578), esta compilação é destinada tanto a harpistas quanto a tecladistas. Contém tentos longos, arranjos de hinos, versículos alternatim para o Kyrie, salmos e cânticos, e versos selecionados dos cânticos para voz solo com acompanhamento instrumental.
Como demonstrado pelas três peças incluídas neste disco, Coelho foi um mestre da técnica da fuga e do cantus firmus em pequena escala. O Verso sobre Ave Maris Stella [faixa 7], baseado no início desse hino mariano, é uma síntese bem-sucedida de contraponto fugal com figuração convencional para teclado, enquanto o versículo Ave Maris Stella [faixa 17], que aparece com texto na fonte, é um arranjo vívido e imaginativamente concebido da melodia completa do hino em cantus firmus. Já o versículo curto usado como resposta ao Ite missa est, que é cantado com a mesma melodia dos Kyries gregorianos, procede de um conjunto de versetos de Kyrie no primeiro tom [faixa 21]. (Bernadette Nelson, 1994 – extraído do encarte. Traduzido do inglês e do alemão pelo Prof. Ralf Rickli <[email protected]> especialmente para esta postagem. Não tem preço!)
Palhinha: ouça 20. Communion motet: Commissa mea pavesco com o Ars Nova Vocal Ensemble.
Masters of The Royal Chapel, Lisbon: A Capella Portugvesa
António Carreira (Lisbon, c1515-c1590) 01. Tento (Stephen Farr, organ)
Filipe de Magalhães (Portugal, c1571-1652) 02. Asperges me
Anonymous 03. (Chant) Introit: Salve sancta parens
Filipe de Magalhães (Portugal, c1571-1652) 04. Missa O soberana luz – Movement 1: Kyrie
05. Missa O soberana luz – Movement 2: Gloria
Anonymous 06. (Chant): Collect: Famulis tuis (soloist: Philip Cave)
Padre Manuel Rodrigues Coelho (1555 – 1635) 07. Gradual substitute: Verso sobre Ave maris stella
Anonymous 08. (Chant): Alleluia: Felix es
Filipe de Magalhães (Portugal, c1571-1652) 09. Missa O soberana luz – Movement 3: Credo
Anonymous 10. (Chant): Offertory: Beata es, Virgo Maria
Francisco Guerrero (Seville, 1528-1599) 11. Offertory motet: Ave virgo sanctissima
Diego de Alvarado (1570-1643) 12. Obra sobre el Pange lingua (Stephen Farr, organ)
Anonymous 13. (Chant): Preface: Per omnia saecula – Dominus vobiscum – Vere dignum et iustum est (soloist: Philip Cave)
Filipe de Magalhães (Portugal, c1571-1652) 14. Missa O soberana luz – Movement 4: Sanctus
Anonymous 15. At the elevation: Obra de sexto tom para o Levantar o Deus (Stephen Farr, organ)
Filipe de Magalhães (Portugal, c1571-1652) 16. Missa O soberana luz – Movement 5: Benedictus
Padre Manuel Rodrigues Coelho (1555 – 1635) 17. Ave maris stella (Stephen Farr, organ verset)
Filipe de Magalhães (Portugal, c1571-1652) 18. Missa O soberana luz – Movement 6: Agnus Dei
Anonymous 19. (Chant): Communion: Beata viscera
Filipe de Magalhães (Portugal, c1571-1652) 20. Communion motet: Commissa mea pavesco
Anonymous 21. (Chant) Dismissall: Ite missa est (soloist Robert MacDonald) – Deo gratias (Stephen Farr, organ)
Francisco Guerrero (Seville, 1528-1599) 22. La luz de vuestros ojos
Estêvão de Brito (Portugal, c1575-Spain, 1641) 23. Salve regina
Masters of The Royal Chapel, Lisbon – 1994
A Capella Portugvesa
Director: Owen Rees
Recorded in the Chapel of All Souls College, Oxford, and on the organ of The Queen’s College, Oxford, on 7, 8 and 9 January 1994.
Nunca fui muito dado a presentear em aniversários e natais. O regalo, pela ocasião, para mim não se justifica. Sempre fui mais de dar presentes para meus amigos pelo que o presente em si representa, por saber que o amigo em questão adoraria aquilo. Eis que numa dessas viagens por esta imensa e formosíssima esfera azul eu me encontrava no Porto, uma das cidades mais fascinantes do planeta. Na Sé estava à venda um CD de música polifônica portuguesa. Olhei para o elenco de faixas e pensei, radiante: “isso é a cara do Avicenna“! Comprei para presenteá-lo. Quando cheguei à sua casa com o pacote em mãos, ele logo abriu o embrulho, sacou o CD da caixa e o pôs para que escutássemos (sinal que gostou mesmo!). O álbum era (é, está aí para vocês baixarem) simplesmente MARAVILHOSO! Sabe quando você dá o presente e ele é tão bom que um capetinha no seu ombro te assopra “viu? Você não deveria ter dado isso: devia ter deixado pra si mesmo!“? Foi isso que senti – não me julguem – por um instante.
O Avicenna, depois, com o trabalho acumulado pelo grande volume de material que o Paulo Castagna lhe passou, acabou deixando a obra digitalizada em minhas mãos pra que a postasse. E ei-la aqui! Que composições escolhidas a dedo! Que coro! Que repertório impecável!
Para entender um pouquinho, copiei o texto do encarte abaixo:
Os finais do séc. XVI e o séc. XVII deverão ser considerados o período áureo da polifonia portuguesa. Contudo, no séc. XVII, uma nova corrente estética, de influência italiana, a que se chamou maneirismo ou pré-barroco, mistura-se com o academismo polifónico, tentando os compositores portugueses a desenvolver uma estética expressiva. Isto é bem notório nesta antologia que agora se apresenta e que já aponta a estética teatral do barroco. Sem dúvida que este período, a que chamamos o séc. XVII musical em Portugal, é verdadeiramente a confluência das correntes europeias do séc. XVI a XVIII.
(texto extraído do encarte)
Muito muito muito muito bom!!! Ouça! Ouça! Deleite-se!
O CD já começa assim:
…E tem esta bela Batalha em meio às peças para coro:
Quam Pulchri
Música sacra portuguesa do século XVII
Estêvão de Brito (1570-1641)
01. O Rex gloriae – para dois Coros a cappella Manuel Cardoso (1566-1650)
02. Magnificat Octavi Tossi – para Coro a cappella a 4 João Rodrigues Esteves (c.1702-1751)
03. Regina caeli – para Coro a 4 e Contínuo Manuel Rodrigues Coelho (1563-1638)
04. Versos sobre Ave Maris Stella – para Órgão e Coro masculino D. João IV ? (1604-1656)
05. Crux Fidelis – para Coro a cappella a 4 Estêvão de Brito (1570-1641)
06. Gaudent in caelis – para Coro a cappella a 6 Fr. Jacinto do Sacramento (séc. XVIII)
07. Tocata em Ré menor – para Órgão solo Diogo Dias Melgaz (1638-1700)
08. Salve Regina – para Coro a cappella 2 4 João Rodrigues Esteves (c.1702-1751)
09. Cum turba plurima – para Coro a 8 e Contínuo Pedro de Araújo (1633-664)
10. Batalha do 6° tom – para Órgão solo João Rodrigues Esteves (c.1702-1751)
11. Quam pulchri sunt – para Coro a cappella Diogo Dias Melgaz (1638-1700)
12. Veni Sancte Spiritus – para dois Coros a 4 e Contínuo
Coro da Sé Catedral do Porto
Eugénio Amorim, regente
António Esteireiro, órgão
Porto, 2010
Devido à escassez dos arquivos causada pelo terramoto de 1755, pelas invasões francesas e pelas várias revoluções, poucas referências temos à vida de Estevão de Brito em Portugal. Sabemos apenas que terá nascido em Serpa, cerca de 1575, tendo depois ido para Évora, onde estudou com Filipe de Magalhães. Assim, Brito é um dos representantes da chamada terceira geração da escola de Évora, a par de figuras como Lopes Morago, Frei Manuel Correia (igualmente alunos de Magalhães), António Fernandes e Manuel Machado (discípulos de Duarte Lobo). A grande qualidade da sua obra é atestada pelo seu percurso profissional, inteiramente decorrido em Espanha, numa época em que teve de competir com compositores formados pelas escolas das grandes catedrais de Espanha, incluindo a Catedral Flamenga de Madrid. Estevão de Brito foi nomeado Mestre de Capela da Catedral de Badajoz em 1597, sendo no entanto provável que já lá desempenhasse funções desde finais do ano anterior. Em 1605, Brito regressa a Évora, convalescendo de uma doença, e trazendo uma mensagem do cabido da catedral para o Arcebispo de Évora, pedindo concordância para a sua ordenação. Foi efectivamente ordenado em 1608 tendo sido, no mesmo ano, nomeado capelão do coro. As obras mais importantes escritas por Brito nos seus anos em Badajoz são, provavelmente, os seus vilancicos para as festas do Natal e Corpo de Deus. Como se tornou hábito no séc. XVII, o mestre de capela era dispensado das suas funções habituais para ter tempo para a composição dos vilancicos, cujas primeiras audições eram aguardadas ansiosamente. Assim, Brito obteve sistematicamente dispensas dos cabidos de Badajoz e Málaga durante toda a sua vida para este efeito. Infelizmente, e apesar de constarem trinta e um, de três a dez vozes, do catálogo da Livraria del Rey D. João IV, não chegaram até nós quaisquer vilancicos da autoria de Estevão de Brito. Em 1613, Estevão de Brito foi eleito entre cinco candidatos (sendo os outros Francisco Paéz, Juan Gutiérrez, Martínez Avalos e Fulgencio Méndez) para o posto de mestre de capela da Catedral de Málaga, sucedendo a Francisco Vázquez. E importante não esquecer que no séc. XVI Cristóbal de Morales tinha também estado em Málaga, razão pela qual Brito tomou contacto com a obra deste grande mestre espanhol da Renascença. Apesar de lhe ter sido oferecido o posto de Mestre de Capela da Capela Real, em Madrid, Brito permaneceu em suas funções em Málaga até à sua morte, em 1641, conservando-se na Catedral desta cidade toda a sua produção musical que chegou até nós.
O Officium Defunctorum de Estevão de Brito encontra-se num livro de facistol, na catedral de Málaga e compreende três lições, do ofício de Matinas, a missa de defuntos, três motetos fúnebres e dois responsórios. O manuscrito contém ainda uma Pro Defundis Missa e um moteto da autoria de Cristóbal de Morales. As três lições, com textos do livro de Job, são a 1ª, 4ª e 7ª das Matinas, ou seja, a primeira de cada Nocturno. No entanto, não era intenção do autor que fossem executadas em liturgia no mesmo dia, destinando-se a primeira às segundas e quintas feiras, a segunda às terças e sextas feiras e a terceira às quartas feiras e sábados. Os textos do Breviarium Romanum tridentino são respeitados na íntegra. A nível musical notamos influências de Morales e de Victoria, cujo Officium Defunctorum contém também uma lição das Matinas, a 2ª Taeclet animam meam. Porém, Brito não é tão rígido na utilização da homofonia, utilizando, por vezes frases imitativas e madrigalismos. (…) De acordo com o Prof. Dr. Aires Nascimento, a pronúncia do texto encontrar-se-ia na linha tradicional da pronúncia do latim. Excluímos assim a pronúncia italianizada ou romanizada utilizada nos meios eclesiásticos e que data do início deste século.
(extraído do encarte)
Mas muito, muito bom mesmo! Ouça! Ouça! Deleite-se!
Estevão de Brito (1575-1641)
Officium Defunctorum
01. Parce Mihi, Domine
02. Responde Mihi
03. Spiritus Meus Attenuabitur
04. Introitus – Requiem Aeternam
05. Kyrie
06. Graduale – Requiem Aeternam
07. Tractus – Absolve, Domine
08. Offertorium – Domine Jesu Christe
09. Sanctus
10. Agnus Dei
11. Communio – Lux Aeterna
12. Ad Dimittendum – Requiescat in Pace
13. Circumdederunt Me
14. Homo Natus de Muliere
15. Heu, Domine
16. Libera Me, Domine
17. Memento Mei
18. Ad Dimittendum – Requiescat in Pace
Grupo Vocal Olisipo
Armando Possante, regente
Saint Georges Church, Lisboa, 1995