.: interlúdio :. Chet Baker em Milão, 1959

A pior pizza que já comi em minha vida foi em Milão. Vá lá. Pizza de aeroporto não é coisa em que nos possamos fiar, mas a pizza do aeroporto de lá talvez só não seja pior do que a produzida pela Subway. Imaginem um disco de arremesso olímpico besuntado com uma coisa vermelha e ácida – segundo dizem, molho de tomates. De passagem, todavia, era o melhor que eu poderia ter conseguido. Decerto que ao lado da sua soberba Catedral, Milão talvez ofereça algo melhor. Milão, que nos evoca ópera e cânticos.

Santo Ambrósio

No alvorecer da Idade Média foi um dos maiores centros da ascendente Igreja Cristã, em um tempo no qual sua influência se espalhava como uma sombra, destruindo templos pagãos, perseguindo filósofos, queimando tesouros literários, cometendo tropelias bem diferentes das que poderia aprovar seu ídolo, o JC. Mas por outro lado, enquanto alguns pensadores do momento, os chamados Patrísticos, demonizavam a música como algo sensual e típico dos costumes pagãos, o bom e doce Santo Ambrósio compunha cânticos que atraiam multidões para seu templo e para seu credo, fundando a chamada Igreja Ambrosiana, com uma tradição canora mais antiga que o Canto Gregoriano.

Aproximadamente dois milênios mais tarde a música seria bem diferente e felizmente profaníssima. E se nada tinha a ver com o passado, agora Milão era visitada por um ‘angelo’. Quando do seu grande sucesso na Itália, foi como batizaram o então jovem Mr. Baker, Il Angelo. O Tromba d’Oro. Resultou que uns idiotas roubaram seu trompete achando que era de ouro mesmo. Foram grandes as aventuras de Chet na Itália naqueles tempos, que lhe valeram inclusive algum tempo atrás das grades. Conta-se que ao entardecer se ouvia um mágico trompete se espalhando sobre os telhados e montes toscanos, como se a carceragem de Lucca guardasse um anjo trompetista – e quem sabe se não era verdade mesmo! Alguns artistas nascem com tal gênio que os poderíamos dizer alados. Como sempre, caímos no mesmo argumento: um dos melhores discos de fulano. A profusão de qualidade na obra de Chet é avassaladora, sob diversos aspectos e sujeita a discussões sobre sua performance, expressão, habilidade. Mas acontece que este é sim um dos seus grandes registros. Os solos são de uma beleza, frescor e perfeição que poderiam ter sido compostos anteriormente e com todo bom gosto e sabedoria. Não foram, era improvisado mesmo, após as encantadores exposições temáticas. Já transcrevi alguns deles e posso provar a excelência arquitetônica da coisa, pela teoria e pela prática. Todas as faixas são standards consagrados do jazz, de autores como Charlie Parker, Tadd Dameron, Miles Davis, Sonny Rollins e Gerry Mulligan. Com destaque especial para Indian Summer, adorável tema do compositor Victor Herbert (de quem existe um fabuloso concerto para violoncelo, vale procurar).

Chet Baker in Milan, 1959

  • Lady Bird
  • Cheryl Blues
  • Tune Up
  • Line For Lyons
  • Pent Up House
  • Look for The Silver Lining
  • Indian Summer
  • My Old Flame

Chet Baker – trompete
Glauco Masetti – sax alto
Gianno Basso – sax tenor
Renato Sellani – piano
Franco Serri – Bass
Gene Victory – Drums

Arranjos de Giulio Libano

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Angelo, ma non troppo

Wellbach

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