Dmitri Shostakovich (1906-1975): Integral dos Quartetos de Cordas (Emerson String Quartet)

IM-PER-DÍ-VEL !!!

Há muitos anos acredito que os 15 quartetos de Shostakovich rivalizam com suas 15 sinfonias em qualidade. Sinto-me instado a ouvi-los sempre com a mesma ou maior atenção que dou às sinfonias. São certamente obras mais íntimas, mas quem disse que o intimismo deva ser menos considerado que os grandes painéis?

Esta é a quinta série completa que conheço. Tenho as dos quartetos Fitzwilliam, Borodin, Shostakovich e Éder (Naxos) e, olha, somando e pesando as qualidades de todos, acho que ficou com o Emerson, apesar do fundamental 8º Quarteto não ser tão DEVASTADOR quanto eu gostaria. Mas a musicalidade do grupo e seu grande senso de estilo dão-lhe o título provisório de campeões. Abaixo, algumas anotações que fiz ao longo dos anos. Não comento todos os quartetos. Minha escolha não significa que goste mais dos que comentei e menos dos outros, é puramente casual.

Quarteto de Cordas Nº 2, Op. 68 (1944)

Este trabalho em quatro movimentos foi escrito em menos de três semanas. A abertura é uma melodia de inspiração folclórica, tipicamente russa. O grande destaque é o originalíssimo segundo movimento, Recitativo e Romance: Adagio. O primeiro violino canta (ou fala) seu recitativo enquanto o trio restante o acompanha como se estivessem numa ópera ou música sacra barroca. O Romance parece música árabe, mas não suficientemente fundamentalista a ponto que a Al Qaeda comemore. Segue-se uma pequena valsa no mesmo estilo. O quarto movimento é um Tema com variações que fecha brilhantemente o quarteto.

É curioso que neste quarteto, talvez por ter sido composto rapidamente, há uma musicalidade simples, leve e nada forçada. Talvez nem seja uma grande obra como os Quartetos Nros. 8 e 12, mas é dos que mais ouço. Afinal, esta é uma lista pessoal e as excentricidades valem, por que não?

Quarteto de Cordas Nº 6, Op. 101 (1956)

Talvez apenas aficionados possam gostar deste esquisito quarteto. Ele tem quatro movimentos, dos quais três são decepcionantes ou descuidados. O intrigante nesta música é o extraordinário terceiro movimento Lento, uma passacaglia barroca que é anunciada solitariamente pelo violoncelo. É de se pensar na insistência que alguns grandes compositores, em seus anos maduros, adotam formas bachianas. Os últimos quartetos e sonatas para piano de Beethoven incluem fugas, Brahms compôs motetos no final de sua vida e Shostakovich não se livrou desta tendência de voltar ao passado comum de todos. Enfim, este quarteto vale por seu terceiro movimento e, com certa boa vontade, pelo Lento – Allegretto final.

Quarteto de Cordas Nº 7, Op. 108 (1960)

Mais um quarteto de Shostakovich com um lindíssimo movimento lento, desta vez baseado no monólogo de Boris Godunov (ópera de Mussorgski baseada em Puchkin), e mais um finale construído em forma de fuga, utilizando temas do primeiro movimento. Uma pequena e curiosa jóia de onze minutos.

Quarteto de Cordas Nº 8, Op. 110 e Sinfonia de Câmara, Op. 110a – Arranjo de Rudolf Barshai (1960)

Na minha opinião, o melhor quarteto de cordas de Shostakovich. Não surpreende que tenha recebido versões orquestrais. Trata-se de uma obra bastante longa para os padrões shostakovichianos de quarteto; tem cinco movimentos, com a duração total ficando entre os 20 minutos (na versão para quarteto de cordas) e 26 (na versão orquestral). O quarteto abre com um comovente Largo de intenso lirismo, o qual é seguido por um agitado Allegro molto, de inspiração folclórica e que fica muito mais seco na versão para quarteto. O terceiro movimento (Allegretto) é uma surpreendente valsinha sinistra a qual é respondida por outra valsa, muito mais lenta e com um acompanhamento curiosamente desmaiado. O quarteto é finalizado por dois belos temas ; o primeiro sendo pontuado por agressivamente por um motivo curto de três notas e o segundo formado por mais uma fuga a quatro vozes utilizando temas dos movimentos anteriores.

Quarteto Nº 9, Op. 117 (1964),
Quarteto Nº 10, Op. 118 (1964) e
Quarteto Nº 11, Op. 122 (1966)

Os quartetos de números 9, 10 e 11 são semelhantes em estrutura e espírito. São os três muito bons e têm em comum o fato de manterem por todo o tempo a alternância entre movimentos rápidos e lentos, sendo tais contrastes ampliados pelo fato de o nono e o décimo primeiro serem compostos por movimentos executados sem interrupções. O décimo ainda separa os primeiros movimentos, porém o Alegretto final surge de dentro de um Adágio. A postura de fazer com que surjam movimentos antagônicos um de dentro do outro é uma particularidade que torna estes quartetos ainda mais interessantes, sendo que o décimo primeiro é um inusitado quarteto de 17 minutos com sete movimentos; isto é, Shostakovich brinca com a apresentação de temas que fazem surgir de si outros muito diversos em estilo, como se o compositor estivesse sofrendo de uma incontrolável superfetação (*). É, no mínimo, desafiador ao ouvinte. Melodicamente são muito ricos, e exploram com insistência incomum os ostinatos, os quais são sempre no máximo belíssimos e no mínimo curiosos. Merecem inteiramente o lugar que modernamente obtiveram no repertório dos quartetos de cordas. É curioso como é fácil confundi-los. Estou ouvindo-os enquanto escrevo e noto quando o CD passa de um para outro, pois têm personalidades muito próprias, mas nunca sei se o que estou ouvindo é o nono ou o décimo. Certamente é uma limitação minha! Já no décimo primeiro, o paroxismo da criação de melodias chega a tal ponto, seus ostinatos são tão alucinados, que é mais fácil reconhecê-lo.

Aliás, o décimo primeiro apresenta aqueles finais tranquilos que constituíram-se uma das assinaturas do Shostakovich final. Esqueçam o gran finale. Sem fazer grande pesquisa, sei que os finais quietos, nada grandiosos, podem ser encontrados na 13ª, 14ª e 15ª sinfonias, neste quarteto e no sensacional Concerto para Violoncelo.

(*) Palavra pouco utilizada, não? Significa a concepção que ocorre quando, no mesmo útero, já há um feto em desenvolvimento.

Quarteto Nº 13, Op. 138 (1970)

Um pouco menos funéreo que a Sinfonia Nº 14, este quarteto foi escrito nos intervalos do tratamento ortopédico que conseguiu devolver-lhe do parte do movimento das mãos e antes do segundo ataque cardíaco. O décimo-terceiro quarteto é um longo e triste adágio de cerca de vinte minutos. O quarteto foi dedicado ao violista Vadim Borisovsky, do Quarteto Beethoven, e a viola não somente abre o quarteto como é seu instrumento principal. Trata-se de um belo quarteto cuja tranquilidade só é quebrada por um pequeno scherzando estranhamente aparentado do bebop (sim, isso mesmo).

Quarteto de Cordas Nº 14, Op. 142 (1972-73)

Este é quase um quarteto para violoncelo solo e trio de cordas, tal é a proeminência dada àquele instrumento. É um quarteto inspiradíssimo, escrito em três movimentos (Allegretto – Adagio – Allegretto), e que tem seu centro dramático em um dilacerante adagio de 9 minutos. Não consigo imaginar uma audição deste quarteto sem a audição em seqüência do Nº 15. Eles, que costumam aparecer juntos, seja em vinil ou em CD, formam, em minha imaginação, uma só música.

Quarteto de Cordas Nº 15, Op. 144 (1974)

Este trabalho, assim como a Sonata para Viola, são tidas como obras-primas e seriam os dois principais “réquiens privados” de Shostakovich. Concordo.

O que dizer de um obra escrita em seis movimentos, em que quatro deles são adagio e os outros dois são adagio molto, sendo que, destes dois últimos, um é uma marcha funeral e outro um epílogo…? Ora, no mínimo que é lenta. Porém, como estamos falando do Shostakovich final, estamos falando de uma obra que tem como fundo a morte. Há três movimentos realmente notáveis nesta música: a Serenata: Adagio, a Marcha Fúnebre – Adagio Molto e o musicalmente espetacular Epílogo – Adagio Molto. O Epílogo recebeu vários arranjos sinfônicos e costuma aparecer — separadamente ou não do resto do quarteto — em gravações orquestrais.

Dmitri Shostakovich (1906 – 1975): Integral dos Quartetos de Cordas com o Emerson String Quartet

CD 1:
String Quartet No.1 in C major, Op.49
1. 1. Moderato [3:56]
2. 2. Moderato [3:59]
3. 3. Allegro molto [2:23]
4. 4. Allegro [3:44]
String Quartet No.2 in A major, Op.68
5. 1. Overture (Moderato con moto) [7:58]
6. 2. Recitative & Romance (Adagio) [9:05]
7. 3. Valse (Allegro) [5:29]
8. 4. Theme & Variations [10:44]
String Quartet No.3 in F major, Op.73
9. 1. Allegretto [6:52]
10. 2. Moderato con moto [4:22]
11. 3. Allegro non troppo [3:50]
12. 4. Adagio [4:44]
13. 5. Moderato [8:19]

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CD 2:
String Quartet No.4 in D major, Op.83
1. 1. Allegretto [3:51]
2. 2. Andantino [6:23]
3. 3. Allegretto [4:35]
4. 4. Allegretto [9:31]
String Quartet No.5 in B flat major, Op.92
5. 1. Allegro non troppo [11:19]
6. 2. Andante [8:29]
7. 3. Moderato [10:22]
String Quartet No.6 in G major op.101
8. 1. Allegretto [6:44]
9. 2. Moderato con moto [4:59]
10. 3. Lento – attacca: [3:58]
11. 4. Lento – Allegretto – Andante – Lento [6:33]

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CD 3:
String Quartet No.7 in F sharp minor, Op.108
1. 1. Allegretto [3:42]
2. 2. Lento [2:49]
3. 3. Allegro [5:06]
String Quartet No.8 in C minor, Op.110
4. 1. Largo [4:34]
5. 2. Allegro molto [2:38]
6. 3. Allegretto [4:05]
7. 4. Largo [4:46]
8. 5. Largo [3:34]
String Quartet No.9 in E flat major, Op.117
9. 1. Moderato con moto [4:24]
10. 2. Adagio [3:47]
11. 3. Allegretto [4:02]
12. 4. Adagio [3:00]
13. 5. Allegro [9:29]
String Quartet No.10 in A flat major, Op.118
14. 1. Andante con moto [4:13]
15. 2. Allegretto furioso [3:58]
16. 3. Adagio [4:49]
17. 4. Allegretto – Andante [8:41]

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CD 4:
1. Adagio (Elegy) for String Quartet [4:35]
2. Allegretto (Polka) for String Quartet [2:47]
String Quartet No.11 in F minor, Op.122
3. 1. Introduction: Andantino [2:12]
4. 2. Scherzo: Allegretto [2:42]
5. 3. Recitative: Adagio [1:08]
6. 4. Etude: Allegro [1:15]
7. 5. Humoresque: Allegro [1:02]
8. 6. Elegy: Adagio [4:12]
9. 7. Finale: Moderato [3:39]
String Quartet No.12 in D flat major, Op.133
10. 1. Moderato – Allegretto [6:29]
11. 2. Allegretto – Adagio – Moderato – Allegretto [19:24]
12. String Quartet No.13 in B flat minor, Op.138 [19:09]

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CD 5:
String Quartet No.14 in F sharp major Op.142
1. 1. Allegretto [8:14]
2. 2. Adagio [8:52]
3. 3. Allegretto [7:59]
String Quartet No.15 in E flat minor, Op.144
4. 1. Elegy [12:37]
5. 2. Serenade [5:47]
6. 3. Intermezzo [1:38]
7. 4. Nocturne [4:30]
8. 5. Funeral March [4:36]
9. 6. Epilogue [6:18]

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Emerson String Quartet

Shostakovich: no topo dos compositores

PQP

16 comments / Add your comment below

  1. Uma BAITA postagem !!! Tenho essa integral e o Emerson Quartet dá um show. Aliás, eles não estão tocando no Brasil por estes dias?

  2. Shostakovich é espetacular. Irônico e tétrico. Meu compositor predileto. Sou fã desse cara. Valeu pela postagem. Vou me esbanjar ouvindo.
    Abraços.

  3. Bendito seja o mano PQP Bach, já fazia um tempo que eu estava correndo atrás dessa versão do quarteto Nº8… Esse allegro molto tem algo de death metal… huahuahua… Bom demais!!!

  4. Baixando.
    Valeu, quando vi o nome vim logo baixar. COnheço um Quarteto dele e gostei, apesar de não se rmuito treinado em música.
    Aliás, a única coisa que conheci dele até agora foi esse Quarteto. Não lembro qual é, ouvindo depois eu digo.
    Mas eu lembro que ele tinha um som característico; não sei se era um intervalo de um tom ou um semitom ou o quê, mas digamos que fosse de um tom, ele fazia por ex: Dó-Ré-Dó-Ré-Dó-Ré-Dó,e aí desenvolvia…

  5. Só tenho a Dmitri Shostakovich Edition da Brilliant Classics, 27 CDs, mas se está aqui a versão Emerson, paciência, vou baixar.

  6. Eu sou um torcedor de Shostakovich. Às vezes ouço novamente um quarteto ou sinfonia só para ver se o espírito de Shostakovich consegue melhorá-lo. Algumas vezes funciona, meus ouvidos percebem diferenças incríveis em audições repetidas. Mas como PQP apontou, nem tudo são rosas. Há quartetos de cordas medianos, com movimentos pouco inspirados. Não resta dúvida, no entanto, que o oitavo quarteto é mesmo uma obra-prima, mas o segundo quarteto é meu preferido. O segundo quarteto não tem uma só nota desperdiçada, é perfeita. Gosto bastante dos quartetos 11, 12 e 13. Todos os anos ouço esses três quartetos em sequência.

    Essa gravação é excelente, mas minha preferência ainda é o ciclo antigo com o Borodin. Tive a oportunidade de vê-los tocando o quarteto n.10 de Shostakovich. Inesquecível.

  7. Baixei, ouvi e me encantei. Muito bom. *—–*
    Obrigada!!!

    Meu novo vicio é o PQP, quero coisa nova já sei onde procurar. rsrs

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